Junho é mês crítico e cheio de contrastes. Diz a sabedoria popular que, nos sonhos, o significado do mês de junho é de sucesso, mas ao mesmo tempo de uma perda enorme. O senso comum confirma esta orientação ao atestar “Junho calmoso, ano formoso” ou “Junho chuvoso, ano perigoso”.
Esta acentuada dicotomia leva-nos a acreditar que a providência divina dormitou brevemente sobre o assunto, tendo inadvertidamente o deus Chronos e a musa Clio misturado os fios do tempo e dando origem a uma multiplicidade de leituras. Como classificar tal atitude? Dirão uns que se trata de negligência pura e dura, outros de apenas e tão só uma fatalidade, imprevisível mesmo à ciência divina que tudo vê, tudo sabe e sobre tudo decide.
Perguntará o leitor qual a relação tempo/divindade para um portal inteiramente dedicado a bombeiros. Se substituirmos as entidades divinas por seres terrenos e habitualmente imperfeitos, concluiremos que negligência e fatalidade são vocábulos vulgarmente utilizados nesta época, ao volátil prazer de cada um.
Segundo o Priberam, negligência é sinónimo de incúria, desleixo. Pergunto eu, por vezes, nos meus momentos de introspeção, se os problemas que assolam a estrutura dos bombeiros não resultam, em grande parte, de negligência humana. É fácil apontar o dedo aos operacionais que, no terreno e durante a época estival, não conseguem controlar devidamente um incêndio florestal devido a fatores distintos, esquecendo alguns iluminados que estes homens e mulheres constituem a ponta mais exposta e visível de um iceberg e apenas atuam no momento em que todo o sistema, a montante, falhou. Falhou a prevenção, falhou a atenção devida às associações, falhou a manutenção de uma estrutura maioritariamente voluntária, essencial a um País e que a trata como se fora a “tropa barata” e até descartável no sistema de proteção e socorro.
Fatalidade? Não creio, amigo leitor. Fatalidades são as inconstâncias climatéricas que nos apanham totalmente desprevenidos. Falamos aqui de negligência, pura e dura. Negligência sobretudo na governação, a todos os níveis e na maioria dos sectores.
Surpreendido? Talvez não, como já vem sendo hábito! Um dos exemplos mais recentes veio publicado no Jornal Nordeste (nº 862, de 21 de Maio de 2013), no qual o Ministro da Educação refere que os docentes do Interior terão que procurar emprego no Litoral, reflexo da desertificação daquela zona do País. Em última instância, assistiremos com a serenidade habitual ao encerramento de infraestruturas educativas por ausência de recursos humanos.
Imaginemos, por ventura, que “a moda pega” e se aplica aos Corpos de Bombeiros. Como referiu o Sérgio Cipriano na sua última crónica, poderemos assistir à morte lenta, à agonia que conduzirá os Corpos de Bombeiros, localizados em sede de concelho, à sua extinção devido à escassez de meios humanos que sempre se disponibilizaram a proteger vidas e bens. Exagerado? Não creio. É que os corpos de bombeiros não são apenas constituídos por docentes, mas também por outros cidadãos que, à míngua de emprego, se deslocam também, de malas aviadas e com toda a família, para o Litoral e mesmo para o exterior do País. Como diz o povo, e com razão, “deixa arder!”.
O que será da população que vai ficar ao abandono, em terras desprovidas de serviços e gentes? Confesso que não quero nem pensar!
Apesar de pequeno, continuamos com um País a duas velocidades por incúria de alguns que não exerceram as suas responsabilidades em devido tempo. Quem sabe, um destes dias, não assistimos também à morte de uma Nação que terá na sua lápide o seguinte epitáfio:
“Aqui jaz um País moribundo, que nasceu forte, enérgico e aventureiro!
Morreu exausto, corroído, depressivo e sem dinheiro.”
José Brás
(Ex-Comandante, Professor)