
Anda aí na Net. Na universidade australiana de Griffith, Queensland, há um concurso anual sobre a definição mais correcta para um termo ou uma expressão contemporânea. Este ano a expressão posta a concurso foi a “politicamente correcto”.
O estudante vencedor foi magistral na definição proposta para o “politicamente correcto”, como “uma doutrina, sustentada por uma minoria iludida e sem lógica, que foi rapidamente promovida pelos média oficiais, e que sustenta a ideia de que é inteiramente possível pegar em pedaços de fezes pelo lado limpo”.
Fica bem patente e bem simbolizada nesta definição a importância dada por alguns à expressão, ao seu alcance, à sua utilidade e, no fundo, à sua própria lógica.
Só quem, na verdade, faz dela a ferramenta ideal, para justificar o vazio, a fuga ao compromisso, o divórcio da realidade objectiva, o iludir das situações, compreende e defende a sua lógica, utilidade e alcance. Todos os outros, por certo, com carácter e convicções vincadas, não entendem nem percebem o recurso tão alargado a essa expressão.
O mundo dos bombeiros, como outros domínios e mundos, também não é estranho ao uso e abuso da expressão “politicamente correcto”.
A expressão identifica bem a típica abordagem de temas vários, mas sempre na vã tentativa de iludir as situações, ora desejando que o tempo as resolva, por utilitária inacção, ou que as circunstâncias as desvalorizem e secundarizem para que se possa seguir adiante passando-lhes ao lado, por demissão ou distracção a jeito.
O “esquecimento” de que todos os anos, a partir de agora, o tema dos fogos florestais é alvo é prova inequívoca do chamado “politicamente correcto”. A partir de agora deixa de fazer parte da agenda política e também da agenda mediática, à margem do protesto, também repetido todos os anos, dos bombeiros, dos dirigentes associativos e comandos.
Em pleno Verão foi “politicamente correcto” vermos muitas gente “inflamar-se” com as chamas, “inflamar-se” com as supostas incapacidades dos bombeiros, “inflamar-se” com a floresta descuidada, desordenada, e com a falta de limpeza nas zonas urbanas e próximas de habitações, “inflamar-se” com os “interesses” dos bombeiros no “negócios” dos fogos.” Inflamaram-se mas não passaram disso.
Mas as situações que envolvem os bombeiros, que alguns pretensamente querem continuar a abordar como “politicamente correctas”, contudo, teimosamente permanecem. Nem o tempo, como os “politicamente correctos” desejaria ou, a sua pretensa desvalorização ou secundarização os vai resolvendo. As situações teimam em prevalecer, pela injustiça, pela ilógica e pela mentira que envolvem e os bombeiros têm sido responsáveis pela tentativa de não as deixar morrer e cair no esquecimento. Às vezes, as tentativas dos bombeiros são inglórias mas noutros casos nem tanto.
Desta feita, em memória e homenagem aos companheiros falecidos este ano, a legitimidade e a vontade dos bombeiros não pode esmorecer. Pode chover a cântaros mas o tema dos incêndios florestais não pode ser esquecido, nem cair em saco roto.
Há quem, como tantas outras vezes no passado, queira encontrar nos bombeiros o bode expiatório para aquilo que outros não fizeram ou não tiveram a coragem de denunciar em tempo na defesa do respectivo tacho. Por isso, os bombeiros continuam a penar e os outros usufruem confortavelmente do descanso “politicamente correcto”.
Rama da Silva