
Lembro-me da história d’ «O Velho, o Rapaz e o Burro» quando andava na antiga 4ª classe. Reza o conto que no percurso que estas três personagens faziam de casa até à feira (onde iriam vender o burro), ouviram todas as críticas e mais algumas. Cada uma diferente da outra. Moral da história: há que pensar pela própria cabeça e fazer o que o coração manda. Ou seja, agir em consciência.
Pedir ajuda para que não falte nada aos Bombeiros enquanto andam a combater o fogo é agir em consciência!
Quando estamos perante um cenário dantesco como se viveu em Abrantes no final de Agosto, quando o Bombeiro enfrenta chamas de 30 e 40 metros de altura, que desafiam a sua pequenez e que nem por isso o demovem de enfrentar o perigo, de recuar, pondo em risco a sua própria vida, todos os pedidos são poucos, sejam de que ordem for. Sejam espirituais, religiosos ou materiais. Pode-se pedir para as pessoas meditarem pelos Bombeiros, para rezarem por eles, para lhes darem alimentos se necessário. Aqueles homens e mulheres precisam ser nutridos no corpo e na alma. E é preciso pedir, sim! A minha avó dizia-me: «Vergonha não é pedir. Vergonha é roubar»! Os bombeiros são demasiado grandes de espírito para sentirem vergonha em pedir. Os Bombeiros têm um elevado sentido de abnegação e uma grande humildade de aceitação perante o que lhes é oferecido. Sim, porque aceitar o que nos dão é um ato de humildade e sabedoria.
Quanto à vergonha, essa deveria ser sentida, sim, por alguns políticos, porque detêm responsabilidades no ordenamento do território, no sistema judicial. Há muito anos, demasiados até, que se fala em prevenção, em rever o ordenamento do território. Quantos mais bombeiros têm de morrer, quantos tantos outros têm de ficar feridos até se perceber que não é no combate que está a solução? E os senhores doutores juízes e os sucessivos ministros da Justiça, quando se resolvem a mudar todo o sistema e deixar de pôr em liberdade todos aqueles que cometeram crimes contra a floresta e o ambiente, depois de terem sido detidos – com grande esforço – pela GNR e pela Polícia Judiciária? Quantos criminosos foram presentes ao juiz e libertados no dia seguinte?
Felizmente que o Incêndio que fustigou Abrantes foi resolvido em menos de 24 horas, porque estavam todas as condições reunidas para que se prolongasse por muito mais tempo, podendo causar graves danos materiais e humanos. Felizmente que houve uma ação conjunta dos mais de 900 operacionais, apoiados por três centenas de veículos, mais de uma dezena de meios aéreos, máquinas de rasto, o envolvimento precioso de toda a população, numa articulação perfeita entre municípios, juntas de freguesia, empresas, indústrias, instituições. Foi um verdadeiro exemplo de cooperação, colaboração e entreajuda. Foi a demonstração de que todos estamos no mesmo barco, todos fazemos parte da mesma sociedade, do mesmo país. A população percebeu que o Estado somos todos nós e que a obrigação da prevenção e do socorro não compete apenas aos governantes, sejam eles nacionais ou locais. Por sua vez os governantes perceberam que a população está ao seu lado, ao lado dos operacionais, com todo o empenho, com toda a garra, a defenderem as suas terras.
Por vezes é preciso uma catástrofe para as pessoas se unirem e entenderem que cada um tem um papel fundamental a desempenhar. A prevenção e o socorro começam em cada um de nós, com a nossa família, a nossa casa, a nossa rua, o nosso bairro, a nossa freguesia, o nosso concelho, o nosso país.
E se por alguma razão for necessário os Bombeiros pedirem seja o que for, que o façam alto e bom som. Porque quem não pede, não ouve Deus!
Gisela Graça