As ambulâncias em que circulam diariamente são de socorro e para o cidadão comum eles são profissionais qualificados. Mas não. Em treze corporações de bombeiros do país – que todos os dias prestam serviços a doentes graves –, não há sequer um elemento com curso de tripulante de ambulância de socorro (TAS). Em outras 81 corporações a probabilidade de ser um não formado a ir buscar um doente urgente também é elevada.
A auditoria que a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) fez a 97% das corporações de bombeiros – e que tal como o i noticiou sábado, em exclusivo, escondeu do ministro Miguel Macedo – revela que as associações de bombeiros de Mourão, Viana do Alentejo, Melo, Ajuda, Avis, Campo Maior, Marvão, Cheires, Provesende, Ribeira Pena, São Pedro do Sul, Farejinhas e Armamar não têm sequer um tripulante de ambulâncias de socorro. Corporações que infringem a lei e prestam serviços de urgência, pondo em causa a saúde dos utentes.
Mas há ainda outras situações em que não se cumpre a legislação em vigor. Em mais de 80 associações de bombeiros não há socorristas em número suficiente para as necessidades existentes e para os meios disponíveis. O estudo, cujos resultados o i está a divulgar em primeira mão desde sábado, dá a conhecer que os distritos com maior número de corporações que não possuem socorristas suficientes são Vila Real com 12, Lisboa com 9 e Porto com 8 (ver página ao lado).
Nas conclusões desta análise – com cerca de 130 páginas – a equipa de auditores da Autoridade Nacional de Protecção Civil remata: “Os corpos de bombeiros indicados não possuem o número mínimo de bombeiros TAS considerados necessários para assegurar, em cumprimento com a lei, a guarnição das ambulâncias.”
Formação e lei insuficientes Na mesma auditoria foi feita uma entrevista a Nelson Batista, formador de TAS e especialista nesta matéria, em que é criticado o actual regulamento de transporte de doentes (que apenas exige a presença de um TAS e um outro elemento com formação menos qualificada na tripulação).
“É insuficiente”, garante este formador, explicando: “Dois tripulantes não conseguem prestar a assistência necessária. Num doente grave, um elemento na célula sanitária é manifestamente insuficiente. A situação anteriormente prevista na lei de três tripulantes por ambulância de socorro seria o ideal.”
Mas esta sugestão levanta sérios problemas. É que em Portugal não existem sequer socorristas suficientes para se cumprir a legislação em vigor, quanto mais para assegurar uma solução que é ainda mais exigente e que requer um número maior de recursos humanos qualificados.
É por isso mesmo que este especialista considera que “o Estado (poder local e central) [deveria] assumir os custos de no mínimo um TAS profissional por corpo de bombeiros”.
Actualmente as duas entidades formadoras destes tripulantes – INEM e Escola Nacional de Bombeiros (ENB) – não conseguem dar resposta a todos os pedidos das corporações. Tal como o i revelou no sábado, só no continente seriam necessários mais 2124 bombeiros com curso TAS para que se atingisse o número mínimo de socorristas (actualmente o país tem apenas 60% dos que precisa).
Para Nelson Batista, a formação de bombeiros em TAS deveria estar apenas a cargo da ENB, uma vez que além das capacidades de emergência médica, estes elementos precisam de outras valências ligadas ao socorrismo. “Um pequeno exemplo: uma vítima alvo de acidente num local de acesso difícil (ravina, etc.) requer a assistência de um TAS com valências suplementares, que o simples TAS do INEM não possui.” Algo que segundo este formador dificilmente acontecerá, uma vez que “o INEM não considera a Escola Nacional de Bombeiros um parceiro privilegiado no sector da formação, com um know-how reconhecido e não a distingue de uma qualquer empresa de formação”.
Sobre o financiamento e a regulação, conclui: “Os bombeiros deverão estar sob um único regulador (ANPC) e uma única superintendência, assegurando-se desta forma uma única fonte de financiamento. A existência de dois ministérios, a Administração Interna e a Saúde, e dois reguladores, a ANPC e o INEM provoca as disfunções de todo o sistema.”
FONTE: Ionline